Rua Quito esq. Montevidéu início dos anos 70


Nossa foto de hoje mostra uma esquina tipicamente suburbana no início dos anos 70, quando o aumento do fluxo de transito modificava as então calmas e muitas vezes não pavimentadas a se transformarem em corredores de tráfego com mão única.
Os dois fuscas descem a Quito rumo a Praça Panamericana cruzando os vastos domínios do Cortume Carioca, que ditou a urbanização dessa parte da Penha Circular com seu enorme complexo industrial que envolvia simplesmente sete quarteirões do bairro, com instalações industriais e administrativas em ruas como a Costa Rica, Montevidéu, Luíza de Figueiredo, Gruçaí, Couto, Patagônia, Jacurutã, Panamá e Quito, onde se encontrava o prédio administrativo, os galpões industriais pioneiros e principais instalações. A Rua Quito inclusive deve muito de sua urbanização ao curtume, que plantou um renque de palmeiras imperiais como a arborizou com as árvores no meio da calçada como um boulevard.
Fundado nos anos 20 a empresa foi crescendo até chegar ao seu ápice nos anos 60, sendo um dos maiores beneficiadores de couro da América Latina empregando duas mil pessoas e girando a economia da Penha Circular, uma rede de serviços orbitava o entorno do complexo, oficinas mecânicas, bares e restaurantes, agências bancárias, lojas importantes da época como Ducal, Bemoreira, Ponto Frio tinham lojas na Rua Nicarágua nos quarteirões entre a Belizário Penna e Couto, onde a estação de trem fomentava uma grande afluxo de pessoas. Essa era a pujança suburbana que se esvaiu nos dias de hoje.
Talvez esse gigantismo ajudou a abreviar o fim do curtume, pois o entorno rapidamente se adensou e as operações industriais, com produtos químicos perigosos e uma enorme carga de efluentes, aliado a um desenvestimento nos sistemas de proteção ao meio ambiente, criaram atritos a partir dos anos 70 entre a empresa e os moradores, a poluição do canal da Rua Gruçaí equivalia a uma cidade de 10.000 habitantes, sem contar com a poluição atmosférica, muitas vezes agravada  com o escape de aerossóis tóxicos.
Além disso, complicações administrativas e a concorrência não só de plantas fabris mais modernas como o advento do couro sintético de boa qualidade levaram nos anos 80 a empresa passar por sérias dificuldades financeiras, agravadas com um incêndio e despejo de produtos tóxicos na baia, o que acarretou não só a condenação da empresa a uma pesada multa como a obrigatoriedade da retirada da planta química da Penha, o que acarretou a venda do Cortume Carioca para uma empresa suíça, empresa essa que sai do Brasil na crise do final dos anos 90, passando o curtume a uma outra empresa e o levando ao fechamento no início dos anos 90.
A partir daí uma espiral de decadência envolveu todas as instalações, que foram se arruinando, não obstante a venda de terrenos, como  já  havia ocorrido no final dos anos 70 como os da Rua Patagônia e a transformação de um dos galpões de armazenamento na Rua Montevidéu no pequeno shopping destinado ao pequeno empreendedor chamado de Trapiche Carioca .
O destino de uma grande empresa foi lamentável, como podemos ver nas imagens mais antigas do street view ( Gruçaí, Luíza de Figueiredo, Panamá,  e Couto) , antes de grande parte dos terrenos começarem a ser transformados em grandes condôminos residenciais, em 2010 e 2011 só vemos ruínas e lixo, como a própria esquina do post onde o prédio que vemos na esquerda depois de sofrer um grande incêndio no meio dos anos 90 estava reduzido a restos do seu primeiro pavimento.
 
Chama por fim a atenção que boa parte do espólio imobiliário da fábrica, que não virou grande condomínio residencial foi ocupado por enormes e bregas templos neo pentecostais, que espelha muito bem a decadência desta cidade e estado.
 

9 comentários em “Rua Quito esq. Montevidéu início dos anos 70”

  1. Bom dia.
    Meu ex-cunhado foi engenheiro químico do cortume e trabalhou lá até 1990 (ou pouco depois), quando o cortume fechou por causa do Plano Collor. Pelo menos, era o que ele dizia na época.

  2. O Curtume, assim como muitas Empresas que existiam na Zona Norte do RJ, e na Baixada, acabaram não somente porque o mundo ficou mais difícil de sustentar qualquer negócio hoje em dia que não tenha ligação com crime organizado, fruto de um processo de globalização que teve muitos pontos positivos, mas também tivera e muito pontos negativos não somente para os EUA, criador disso, mas também para o mundo como um todo.
    Era uma época que não se precisava temer do assim chamado “Perigo Amarelo”, tão comum dos anos 90 para cá que ajudou a reformular do processo econômico no planeta, mas que também ajudou a fechar parques e mais parques industriais que havia no mundo em todo, em várias nações e que hoje, viraram lembranças de uma época que já vai longe, porque o predomínio econômico hoje está nas mãos do Leste do planeta, ou melhor, dos Tigres Asiáticos.
    Mas a grande crise que levou o encerramento de dezenas de fábricas e indústrias no RJ teve também parcela de culpa de nossa ineficiente economia, com sucessivos planos econômicos que destruíram muitos empreendimentos, coisa típica de uma nação corrupta desde berço, mas também dos assim chamados Chefes Políticos locais que assim contribuíram também para que a violência, o crime, e o favelismo reinasse absoluto nessa cidade.
    Não é preciso dizer aqui de que outros ares do país muito torceram e ainda torcem pela falência definitiva do RJ. Que o diga os tempos modernos que muitos por aí, inclusive da assim conhecida Estranha Cidade do Sudeste, são os que mais torcem para a aniquilação total dessa cidade.
    Outro fator foi infelizmente o que aconteceu a partir da década de 50 em que levas de migrantes sem do menor preparo para nada vieram, se estabeleceram, ficaram, criaram raízes e hoje estão na quinta geração, não mantendo compromisso com a terra aqui que os acolhera, mas na verdade virando uma verdadeira “Organização” que traz levas e levas de migrantes para cá, só fazendo por inchar da cidade.
    Hoje, o que vejo nas ruas é um RJ decadente, com um mendigo novo a cada dia que eu saio a rua, muitos andarilhos, bandidos, criminosos de toda estirpe, e por aí vai.
    Nosso parque industrial virou favela.
    Se ainda tivéssemos Empresas, Indústrias, e fábricas por aqui, tenho da certeza de que a crise no RJ teria sido bem menor.
    Infelizmente somos o que escolhemos.

  3. Quase tudo já foi pelo Wolfgang. A Penha e arredores hoje em dia, estão entre os locais mais perigosos e degradados do Rio. A “migração” mencionada foi uma das principais causas da destruição do Rio pelos fatores já descritos e por muitos outros que devido à crueza de seus termos, eu prefiro declinar. A hipocrisia também é uma dos principais chagas da sociedade brasileira, cujo futuro é sombrio mas inevitável. A política prevalece nos fóruns de temas diversos e “neste sítio” não é diferente pois muitos vêem com bons olhos uma dura intervenção militar. Blogs como esse deixaram de ser apenas voltados para assuntos do passado e passaram acolher opiniões preciosas sobre um futuro incerto. Personagens canhestros, agressivos, e arrogantes, “donos da verdade e da sabedoria”, talvez ressentidos com “bordoadas e cascudos” quem sabe bem aplicados em seu tempo de estudante, não cabem mais nesses tempos que se avizinham. Serão “outros tempos”?

  4. Conheci o Curtume Carioca no seu ápice, em 1963, ciceronado pelo gerente geral da planta. Nessa época era o maior curtume da América Latina. As instalações eram excelentes e a limpeza constante. Contudo, o cheiro era muito forte e a quantidade de urubús pousados ao sol no canal da rua Gruçaí era incrível, uma imagem que nunca saiu da minha memória, clara sinal de que o efluente, descarregado in natura, devia conter abundantes restos de carne. Passaram 55 anos e os efluentes, industriais ou domésticos descarregados in natura, continuam sendo a regra, nunca a exceção.

  5. Quantas regiões do Rio não foram “fagocitadas” como gosta de dizer o Andre? Fábricas e mais fábricas foram desativadas e invadidas, as indústrias foram para o brejo e ficou por isto mesmo. A que ponto chegamos!

  6. Observo q salta aos olhos a falta de pintura nas casas e prédios no Rio como um todo, lamentável.
    Nos anos 70 era bem o contrário. .

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