Bairro da Misericórdia IV

Semana passada foi noticiado nos jornais que finalmente o TJ-RJ ganhou a queda de braço que fazia com determinados setores da prefeitura e finalmente conseguirá construir mais prédios modernos no entorno da abandonada Praça dos Espedicionários, marco de onde ficava o “Castelo” do Morro do Descanso e nas margens do bairro mais antigo da cidade, hoje praticamente desaparecido.

Alguns frequentadores do site pediram que fosse dado um repeteco, já que estamos ainda nas reprises, sobre uma série feita em 2006 sobre o bairro, com mapas e fotos aéreas. Estou então colocando a série e em seguida começaremos com o material inédito novamente.

 

Essa semana iniciamos mais uma pequena série, que falará sobre o desaparecido Bairro da Misericórdia, ela será composta por mapas e fotos que poderão dar a idéia de um bairro hoje totalmente extinto e que começou a desaparecer há 100 anos com a construção do Mercado Municipal, hoje também desaparecido, passando pela Expo de 1922, desmonte do Castelo, e construção do Perimetral e Fórum, terminando nos anos 70 com demolições espairadas que eliminaram os últimos vestígios do primeiro bairro plano da cidade e um dos mais populosos na metade do sec. XIX.
Hoje teremos um mapa de 1895, que mostra um projeto pra o prolongamento do Cais Pharoux até a Ponta do Calabouço.
Para termos uma idéia do tecido urbano vou mencionar os poucos pontos que temos em comum desse mapa com a cidade hoje.
No extremo esquerdo vemos assinalada com uma cruz a igreja de São José, nessa época ainda endereçada na rua da Misericórdia, indo em direção ao mar vemos o prédio da Caixa Econômica, existente até hoje e ocupado pela PGE, o prédio já foi objeto de 2 post’s aqui nesse ano (  http://www.fotolog.com/andredecourt/17364621 e http://www.fotolog.com/andredecourt/17388850 ) na direita do mapa a outra cruz assinala a igreja de Nsra. de Bonsucesso, incrustado conjunto arquitetônico da Santa Casa, que nessa época também abrigava a faculdade de medicina.
Nas ruas desaparecidas, podemos ver o traçado espontâneo da velha cidade, e tiramos conclusões interessantes, a rua do Cotovelo, depois Vieira Fazenda, ia nessa época até o mar, terminando depois dentro do Hall dos elevadores do edifício Menezes Cortes no encontro desta com a ladeira homônima e com a Rua do Carmo.
A cruz com o prédio negro assinala o velho Necrotério do Moura, um dos dois morgues da cidade, na época o segundo ficava junto ao hospital da Ordem Terceira no Largo da Carioca. Onde hoje temos o fórum vemos um maciço quarteirão envolto pelas ruas de D. Manoel, Misericórdia, Cotovelo e Beco dos Ferreiros. Na realidade tal quarteirão era composto de várias azináguas, becos e travessas com profundos sobrados, um lugar sombrio e onde certamente se encontravam as casas de ópio mencionadas por Luiz Edmundo.
O quartel, hoje desaparecido abrigava o Regimento do Moura, que dava nome ao largo na sua fronte, ao necrotério, e indiretamente nomeava outros logradouros com o Beco da Música, assim nomeado pois era onde a banda do regimento ensaiava, Beco do Moura, Largo e Beco da Batalha.

 No mapa de hoje vemos o início do desaparecimento do velho Bairro da Misericórdia, com a construção do velho Mercado Municipal.
O mercado ocuparia uma enorme área, do Largo do Moura, como também do litoral pondo fim aos pequenos trapiches existentes, embora a região viesse sendo aterrada à passos de cágado desde a data do último mapa.
Mas para a velha cidade o desaparecimento do Necrotério do Moura e do Chafariz do Largo, construído em 1794 pelo Conde de Rezende, eram os fatos mais emblemáticos, como a diminuição do largo em si. O Necrotério alimentava a imaginação popular e as crônicas policiais da cidade à época, o velho chafariz era usado pelas lavadeiras da região, que forneciam roupas limpas e baratas para um grande parte da cidade.
Mas o largo era o tipo de região que a cidade, que se modernizava, queria ver desaparecido, reduto da fina flor da malandragem, reduto de capoeiristas, picadeiro de pequenas trupes circenses, local de diversão da soldadesca etc. A cidade já vinha tentando mudar essa velha parte da cidade, neste mapa é interessante observar na direita do mapa que apenas o Beco da Música possuía o seu nome histórico, logradouros como o Beco do Guindaste e o Beco da Boa Morte já tinham tido o seus nomes trocados.
Para a construção do Mercado até uma área do Arsenal de Guerra foi usada, pois afinal o mercado era enorme, possuía 22.500 metros quadrados.