Desabamento do Morro do Querosene 1962 – Parte I

A cidade conhece desde tempos idos a instabilidade de seus morros, e sua grande capacidade de destruição e de ceifar vidas, sendo a primeira grande tragédia a Águas do Monte, no início do séc. XIX onde uma grande aba do Morro do Castelo se precipitou sobre o bairro da Misericórdia causando muita destruição e mortes.
Alguns desabamentos, por não terem acontecidos de forma trágica, não tendo vitimado pessoas, ou então eclipsados por eventos futuros acabam sendo esquecidos no passar dos tempos.
O desabamento do Morro do Querosene, que embora não tenha provocado uma tragédia em matéria de vidas mudou a geografia de um bairro e ajudou a acelerar seu processo de decadência, portanto merece ser lembrado e retirado das notas do passado.
Final de Março de 1962, os jornais noticiam que enormes fendas surgem no Morro do Querosene, a aba do Morro de São Carlos virada para Santa Teresa, criando um enorme movimento de terra. As providências foram as de sempre, interdição de prédios, início de remoção de barracos e isolamento da área, sob risco de demolição pela defesa civil e dos bombeiros.

Na foto vemos o início do ocorrido, a foto é tirada da esquina da Rua Itapiru com a Gal. Galvão, vemos que a rua ainda tinha, embora em estado ruim, os velhos sobradões do séc. XIX, quando ela era um dos nobres acessos a parte de Santa Teresa e não a perigosa boca de favela de hoje. Entre os dois postes, na esquerda da imagem temos um dos escadões de acesso ao Querosene, dali, o antigo número 916 da R. Itapiru, para a esquerda tudo estava interditado, vemos  inclusive um caminhão do EGB retirando os pertences dos moradores, bem como algumas placas de terra deslocadas na parte nua do morro.
Especialistas foram chamados, de início descartava-se a demolição dos imóveis da Rua Itapiru, apenas a remoção de barracos, dependurados nas fendas e na parte instável do morro, e o desbaste de parte da encosta para voltá-la ao equilíbrio. Os professores de geologia Hermann Hardelehrmer e Otacílio Francisconi que conduziam numerosos alunos da Nacional de Geologia afirmavam que o morro, composto de argila e rochas soltas estava bem na linha de uma falha de terreno, a mesma que provocou o desabamento dentro das obras do Túnel Santa Bárbara e que uma sucessão de erros e más práticas, que se originavam desde a abertura da Rua Itapiru no séc. XIX foram ao longo dos anos contribuindo com a grande área de instabilidade, culminando com o corte da encosta para a construção do prédio de número 1026 da R. Itapiru,  desestabilzou de vez a encosta, fato essa comprovado durante duas obras pelos constantes desabamentos junto ao corte feito,como relatavam os vizinhos do prédio.
Os dias foram se passando a movimentação de terra foi ficando cada vez mais gravosa, as fendas em alguns lugares chegavam a mais de metro de largura e postes e árvores dentro da favela se inclinavam, bem como o deslocamento do muro de arrimo do prédio 918 da R. Irapiru, que além das rachaduras se deslocou e deformou em forma de zig-zag,  demonstrando a instabilidade de todo o terreno.
Com o agravamento do deslocamento além das interdições, que incluíam a proibição do tráfego de bondes o desligamento da rede de gás da rua e de parte do circuito de iluminação e energia, determinou-se a imediata demolição vários prédios , infelizmente os proprietários desses prédios iam perder seus imóveis por fato que não deram causa diretamente.
Embora nenhum dos imóveis  tivesse sido demolido, nos poucos dias após a determinação oficial as fendas no topo do morro já chegavam a 3 metros de largura e o risco de uma grande tragédia aumentava cada vez mais, os moradores do morro se recusavam a desocupar seus barracos, os acessando pela R. Frei Caneca, bem como curiosos escalavam as instáveis encostas.
Dado o risco de uma grande avalanche determinou-se a imediata demolição, sem apelos dos prédios de número 992 e 998 e 1016 para que se desse acesso as máquinas que iriam começar a manipular as encostas.

 

Vemos nas imagens acima o ponto de acesso as máquinas bem como o prédio geminado de número 992 e 998, certamente um velho sobradão do séc. XIX com elementos modernos.