Desde sua criação a Universidade do Brasil procurava um projeto definitivo para a instalação de seu Campus, o local ideal, desde os primeiros projetos ainda no tempo de Agache davam a Praia Vermelha como o local ideal, e aliás onde deveria ter sido construído.
Mas com a queda da República Velha os planos originais foram rasgados, alguns foram “colados” ressuscitados com outros nomes, e outros sepultados de vez.
Um dos projetos que estavam sendo “colados” era a da Cidade Universitária, Gustavo Capanema, o poderoso ministro da educação da Era Vargas inciava em 1935 os primeiros projetos para a construção do campus da Universidade do Brasil, chamado de Cidade Universitária, que ultrapassava não só os conceitos arquitetônicos de um grande campus, mas também a filosofia da organização deste entre as diversas faculdades e institutos. Sendo então criado uma comissão interna, com professores da casa para a elaboração dos planos de elaboração, implantação e construção.
Mas o ministro, certamente dentro da ideologia fascista que dominada o alto escalão do governo à época atropelou não só a comissão criada dentro da Universidade bem como a legislação brasileira, chamando o arquiteto do orgulho fascista, Marcello Piancentini, autor do projeto da Universidade de Roma.
Mas entre as cartas e pedidos, enviados seguindo os tramites diplomáticos entre os dois governos amigos, e a chegada de Piacentini, em Julho de 1935 o Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura do Distrito Federal, publica crítica carta, dizendo que o ministro estava desrespeitando lei pátria ( Dec. 23.569/33 ) que determinava que, os órgão governamentais, em todas suas esferas só poderiam contratar engenheiros, arquitetos e demais profissões sob o guarda-chuva do CREA, diplomados por universidades brasileiras ou equiparadas. Afirmando que a contratação do arquiteto italiano era um afronta não só a este dispositivo como também a Constituição de 1934 que proibia a estrangeiros serem profissionais liberais.
Durante essa pequena tempestade chega Piacentini em 13 de Agosto de 35, ficando apenas 11 dias, sob a desculpa de ser apenas mero consultor do ministério. Tendo sido mostrado a este “consultor” os lugares imaginados, Praia Vermelha, São Cristóvão e adjacências e até mesmo Vila Valqueire.
Certamente pelos projetos apresentados Piacentini ficou com a região da Quinta e Maracanã, logo de cara.
Mas a confusão estava só aumentando, pressionado Capanema criou uma comissão de arquitetos brasileiros para escolherem o local e apresentarem o projeto do futuro campus. Mas nesse meio tempo também fechava contatos com o arquiteto Werner Mach, criador do estádio olímpico de Hitler e vila de atletas anexa, reforçando os ideais fascistas do regime brasileiro, pouco mais de ano antes do Estado Novo.
Pouco depois, a Comissão julga São Cristóvão como o melhor lugar, mas nesse ínterim Lúcio Costa apresenta seu projeto, conjunto com mais algum dos membros da Comissão de uma Cidade Universitária na Lagoa Rodrigo de Freitas, complexa obra que partia alinhada com a Rua Humaitá, na região da antiga Praia da Piaçava, onde uma larga avenida sobre palafitas daria acesso a dezenas de prédios uniformes, também em palafitas sobre as águas da Lagoa, os prédios teriam jardins suspensos e pontes os interligando, além a avenida principal. Com certeza Conde bebeu nessa fonte ao projetar, 30 e poucos anos à frente, a UEG curiosamente perto da Quinta.
Mas a Comissão, não aceitava o projeto capitaneado por Lúcio Costa, e a ele impunham várias dificuldades de ordem técnica, certamente totalmente coerentes analisando-se o tresloucado projeto, mas em época de forte polarização política os ideais comunistas de alguns autores deste projeto.
Mas, não obstante a confusão de idéias reinantes, é inserido mais um elemento Le-Corbousier, que chega no Hindenbourg em Julho de 1936, quando o projeto de Lúcio Costa já estava sepultado. O revolucionário arquiteto francês, antítese de Piacentini, monta escritório e equipe e pouco depois apresenta seu projeto não só de cidade unioversitária, mas sim um projeto global para toda a cidade. Aquele que incluía as vias suspensas nas encostas. E dentro uma cidade universitária, moderna toda sobre pilotis, mas com prédios muito sofisticados, inclusive com ar-condicionado central. Totalmente diferente do que imaginava Piacentini, mas mais convencional que o que imaginava Lúcio Costa. Mas seu projeto foi rechaçado. Alegava a Comissão que a implantação seria caríssima, a manutenção complicada por os prédios serem diferentes entre si, e que o arquiteto tinha incluído inúmeros equipamentos não inseridos no programa da Universidade do Brasil, como museus e outras escolas. Mais um projeto descartado.
Isso desagradou em muito os modernistas brasileiros, principalmente que ficava cada vez mais claro que o ideal fascista, italiano ou alemão era o procurado pelo ministério, o prêmio de consolação a esta escola seria o prédio do MEC, aprovado por Capanema.
Nesse ínterim, as conversações entre Capanema e Piacentini continuavam. Com a dissolução da Comissão em 1937 o ministro e o governo ficavam mais livres para acertar o seu ideal de Cidade Universitária.
Mas as conversações não eram muito amigáveis, um ano antes Piacentini sobre pela imprensa da existência dos debates, que corriam sem sua participação, inclusive com a presença de Corbousier, deixando italiano furioso. Capanema responde que por força de lei deveria ser feita uma comissão de arquitetos brasileiros, mas que havia interesse em sua acessoria, quiçá projeto.
Mas maculado Piacentini, diz que aceita a participar, mas que quem voltará ao Rio será seu assistente, Vitor Morpurgo, a quem certamente o projeto da Cidade universitária da Quinta deveria ser dada sua autoria, pois certamente o maculado Piacentini pouco participou do projeto.
Nesse meio tempo Capanema, se reúne com Vargas, fazendo uma retrospectiva, ao caudilho, de todos os fracassos dos planos anteriores. Dizendo que certamente os mais indicados seriam Piacentini e seu assistente. Com a explanação Capanema conseguiu a autorização presidencial e Morpurgo chega ao Rio em Setembro de 1937. Pela lei, caberia aos italianos a organização espacial, o posicionamento dos prédios, sua aprovação dentro do programa. Cabendo aos arquitetos brasileiros o projeto dos prédios. Na Itália, depois de aprovado o plano por uma nova comissão, Mopurgo e Piacentini, fazem uma grande maquete do projeto, que ironicamente fica retida na alfândega brasileira, só sendo desembaraçada com um ofício da presidência.
Mas a maquete antes de seguir para o Brasil foi exposta na embaixada brasileira em Roma, sendo destaque dos jornais romanos, que exultavam a grande passarela por cima da linha férrea, o belo estádio olímpico, a impressionante Praça da Reitoria composta pelos prédios das faculdades de Direito, Ciências Sociais e Letras. A Faculdade de Engenharia, próxima a linha do trem e junto a parque industrial da Rua Visconde de Niterói também era outro destaque, como o conjunto médico, com o grande Hospital das Clínicas e o prédio de enfermagem se inserindo do Bairro de São Cristóvão.
O velho Palácio Imperial, seria inserido no projeto, modificado para ser uma sala de Concertos e escola de Música, e coroando o projeto um grande observatório astronômico no topo do Morro da Mangueira, ou Telégrafo.
As imagens falam por sí, não só o Maracanã, bem como todas as transformações que querem fazer na área para a Copa de 2014 bebem profundamente no projeto de Morpurgo e Piacentini.
A Cidade Universitária, foi aprovada, conforme a maquete mostrada em 03 das imagens, mas em 1944 ela é transferida pra Vila Valqueire e em 1945 jogada para o Fundão, rasgando-se o projeto fascista, mas muito curioso, feito nos anos 40.
O mais interessante é que talvez os italianos tenham levado um grande beiço do governo brasileiro, pois em 1940, sabe-se de correspondências de Piacentini reclamando a Capanema o pagamento de valores equivalentes a 300 contos de honorários restantes, num total de 600. Se não receberam até a declaração de guerra possivelmente nunca mais viram a cor desse dinheiro.
Agradeço aos arquivos da UFRJ, FAU/UFRJ, FGV e SIMON SCHWARTZMAN, pelas fontes aqui bebidas.
E por fim, ao amigo Carlos Ponce de Leon de Paiva, pelas 03 fotos da maquete, que me deixaram curioso a efetuar uma pesquisa mais profunda sobre o tema.